sábado, 1 de setembro de 2007

Do livro Vertentes & Transversais de José Ailton - Bahia


VINTE E TRÊS HORAS, PRIMEIRO DE JUNHO...1991
O RIO MADEIRA, O LUAR E A REVOLTA POPLURAL



Rio Madeira, Humaitá - AM


Era um sábado! Sim e daí?
Deveria ser um sábado como outro qualquer. Mas...
A lua reinava prateada sobre a amazonense cidade de Humaitá, encaixada entre a transamazônica e a BR-319 e corria sem muito alarde, o rio Madeira, suas águas turvas como a cidade quando sem luar.
As pessoas, um formigueiro humano, em todas as direções e levavam para lá e para cá, além de sonhos, mercadorias as mais diversas, numa distribuição perfeita e sem ganância. Tem para todos! Reclamou o condutor de carrinho de mão.
Chegante ali, me veio a curiosidade! Qual a razão dessa balbúrdia? Não tardou muito e um nativo um tanto explosivo desabafou: “Oh idiota será que só você não sabe que o prefeito, o vice e seus bajuladores vem há muito tempo metendo a mão no nosso dinheiro? Será que você não enxerga a falta de energia que vem nos torturando, além da água que não chega às torneiras. É uma história de dois anos”.
- Ah! Entendi, entendi! Respondi-lhe um tanto trêmulo.
Àquela altura, vinte e três horas, daquele primeiro de junho, inicio de verão amazônico de 1991, foi possível saber também que os protagonistas de tal situação (os chefes do executivo) estavam sitiados e situados no Quartel do Exército. Se não debandassem para lá estaria eu certamente contando a história de duas autoridades incineradas e suas cinzas remetidas para o Hades da maldição ou na melhor das hipóteses, lançadas ao rio Madeira. Foi possível se salvarem do cinéreo castigo, em contrapartida, seus bens pessoais foram impiedosamente sacrificados, saqueados e perecidos em meio às chamas vorazes.
O padre foi localizado e fez questão de louvar a vontade popular e na minha insípida condição de escriba de um matutino de Porto velho, tive em toda minha vida, a primeira lição de equitatividade socialista. Nem Cristo, tampouco Marx, chegaram a sonhar tanto!
Quinze dias depois, volto a minha condição de intruso. Novamente em Humaitá. A cidade adormecida qual um anjo e a informação obtida é que a revolta foi um remédio, pois como passe de mágica foram restabelecidos os fornecimentos de água e energia. O pároco local disse AMÉM. O pastor entoou uma sonora ALELUIA e o Delegado deixou escapar um estrondoso puta que o pariu e o rio Madeira voltou a ser o refletor natural da cidade, agora, bastante iluminada.

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